quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

ALUGAM-SE PESSOAS

ALUGUEL DE PESSOAS

João Joaquim  

Quando se fala em aluguel ou locação vem à mente de qualquer pessoa aquela tomada de empréstimo de um objeto, um bem, um imóvel, um animal para cavalgadura e outros serviços. E até mesmo os próprios serviços. Nos tempos modernos, de tantas mudanças sociais, das relações humanas mais distensíveis surgiu um novo tipo de aluguel. O de pessoas. Com um diferencial nesta nova modalidade, em geral não se paga nada pela locação. Esse novo inquilino pertence ao grupo dos folgados ou exploradores de gente. Geralmente esse novo locatário é um parente (a), um classificado amigo próximo ou contraparente ou  aderente. Não importa.
Essa relação em geral se estabelece, não de forma um tanto sub-reptícia ou de chofre, mas à moda paulatina e dissimulada. Os meios empregados são vários. Indo desde a posse de bens e objetos e dinheiro do outro até a ocupação do tempo.
O aluguel da pessoa pode se dar na forma abstrata. Isto é : nem sempre de forma substancial ou material .  Pode ser  via celular ou pelas  redes sociais. E a vítima ou locador vai se enredando, caindo nas graças ou rede desse novo inquilino . Nessa modalidade de aluguel, a vítima ou locador vai dispondo de seu tempo, minutos, horas a fio por conta de quem aluga a pessoa.
Era uma vez, já faz duas décadas, eu ouvi um antigo professor meu dar uma entrevista. Coisa rara em suas aparições. Chamava-se Joseph Minder (1940-2010). Pela raridade tal entrevista ficou em minha memória permanente. Minder era um profundo estudioso de sociologia, psicologia do comportamento humano e filosofia. Muito centrado, introspectivo, cenho sempre severo, pouco riso e fala escandida e serena. Reverberava um misto de admiração e respeito. Suas frases e opiniões, quando proferidas soavam como diretrizes de vida. Nessa fortuita e inopinada entrevista o professor Joseph, como era arguido falava sobre a exploração do outro. Uma expressão por ele empregada ficou inscrita em minha mente. “O aluguel do outro”. Locução que fez parte da temática, a exploração do outro.
Ao se falar na questão do exploração socioeconômica, poder-se-ia buscar as teorias já bem conhecidas do comunismo, do capitalismo, das teses de Karl Marx. Sua obra mais conhecida é o Capital. Soa estranho! Mas, o título é esse mesmo;  da relação entre capitalismo, poder e proletariado.
Nem tampouco quero falar da escravidão social , naqueles moldes mais hediondos, quando os africanos negros eram tratados como animais. Digo mal porque eram tratados ou maltratados pior do que animais, seviciados, torturados e mortos. E vendidos como mercadorias. Aquela escravidão horrenda, medonha, terrificante foi abolida no Brasil, em 1888. Decreto esse assinado pela princesa Izabel, a filha de Dom Pedro II, que estava em viagem , fora do País.
Hoje, impera no Brasil e no mundo a chamada escravidão dissimulada, de brancos e negros. Não importa a etnia. Temo-la de duas categorias: a informal e a formal ou legal. Na categoria informal, a escravidão se dá no mesmo estilo de tráfico negreiro. O trabalho é do mesmo modo explorado. Em geral o trabalhador braçal é cooptado por um agenciador, levado para os campos agropastoris e lá mantido como em trabalhos forçados. Sem as mínimas condições sanitárias ou tratamento digno, sem salário ou direitos trabalhistas. Já na chamada escravidão formal, o operário, seja ele rural ou urbano (construção civil, infraestrutura) tem até carteira de trabalho assinada, direito de atendimento pelo SUS, etc.
Todavia, se ele adoecer tem o risco de morrer nas filas dos hospitais públicos, os filhos estudam nas piores escolas públicas. Ao final de cada mês, o salário mal dá para o aluguel de um barracão ou casebre popular. Depois de 35 anos trabalhados, o proletário, já todo alquebrado, esclerótico e debilitado vai receber um mísero salário mínimo. Isto se o trabalhador sobreviver a esse saco de injúrias. Talvez os braçais da escravidão negreira tivessem melhor qualidade de vida. Ao menos o sujeito comia muita feijoada, garapa, melado e rapadura.
Conforme preleção do professor Joseph, existe no íntimo de muitas pessoas uma semente desejosa de explorar o outro em todas as suas potencialidades e força de trabalho. Em um outro polo, existe também uma legião de pessoas com uma predisposição em ser exploradas, sugadas, alugadas e maltratadas.
Há um livreto, uma obra, pequena em volume, mas magnânima nesse sentido. Chama-se o discurso sobre a servidão voluntária, de Éttienne de La Boétie ( 1530-1563) . Nessa monumental tese Éttiene fala da relação que se estabelece entre o tirano e os súditos ou tiranizados. Tal relação de explorador e explorados vai se fazendo em cadeia num efeito dominó. O mais curioso é como tal ligação se dá nas cenas e rotinas, as mais comezinhas e ordinárias das pessoas. No caso de um tirano de Estado. Ele tem um séquito de pessoas que o assessoram. Ministros, chefes disso e daquilo. Estes , por sua vez, vao tiranizando e alugando os subalternos, os de hierarquia menor.
Nesse sentido, basta que cada um olhe para o seu círculo de “amigos”, colegas, contatos os mais variados. Esse entorno está representado por parentes, contraparentes, aderentes e repelentes. São os manos, os cunhados, os concunhados e outros tais. Como se encontram esses tais fidagais nos meios familiares!
Assim, ninguém escapa a esses alugadores e alugadoras. São exploradores (as) dos parentes classificados como bonzinhos, solidários, gente boa. Muitos dos, de fato, aqui generosos e honestos são manipulados, alugados e sugados em sua energia, em seus préstimos pessoais, em suas horas de direito ao descanso e ao ócio.
Na lábia e aliciamento desses indesejados parentes e contraparentes vão ainda objetos e utensílios nunca devolvidos, empréstimos de dinheiro nunca pagos e outros mimos e favores jamais retribuídos na mesma intensidade.

Por isso concluo que a melhor resposta contra esses aluguéis e exploração pessoal; o melhor troco ou revindita a essas insolentes pessoas é um contundente e penetrante. Não. Se insistirem, não e não!. Dezembro/ 2108

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