domingo, 31 de maio de 2015

CHARLATÕES DIPLOMADOS

CHARLATÕES DIPLOMADOS, CUIDADO COM ELES 
 João Joaquim


 Eu penso que no Brasil charlatanismo é parecido com assalto em termos de frequência. Quase todo mundo já foi vítima dessa prática. Eu sou uma dessas vítimas. Já fui enganado  por dentista falso e por farmacêutico que se passava por médico. Esses dois tipos de fraudadores são muito frequentes na sociedade. Existem muitos outros que exploram a fé , a boa-fé e credulidade das pessoas. Nas TVs temos desde pastores e bispos que vendem indulgências, curam doentes de câncer , fazem  terapias do amor, até garantia de um lugar no paraíso .   Mas, afinal de contas o que é charlatanismo? Numa definição genérica pode-se conceituá-lo como o exercício de uma atividade para a qual o suposto profissional não tem qualificação para tal. A venda de um produto ou procedimento sem comprovada eficácia . Todavia, tal prática também se dá por profissionais diplomados e atuam  na área da saúde. Médico, dentista, psicólogo, terapeutas etc.
O termo charlatão  deriva de ciarlare (falar, conversar, parlar). Um verbete equivalente seria parlapatão. Seria aquele indivíduo de boa comunicação, bom orador, de lábia afiada, e portanto usaria dessas habilidades para ludibriar e enganar os desavisados e facilmente sugestionados por uma boa e convincente conversa( sofisma). A semelhança com muitos políticos não é mera coincidência. No mundo atual se sabe que mesmo aquele profissional diplomado e especializado pode se dar  à prática do charlatanismo. E temos exemplos em profusão na área de saúde. Os médicos principalmente. Como isto se dá de forma objetiva? Todo profissional que prescreve uma terapia ou procedimento sem bases científicas, ele está praticando o charlatanismo. Imagine você , caro leitor(a) ir a um médico . Ele mal ouve ou examina o doente e  pede  uma lista de 30 ou 40 exames . Isto já é um indicio de charlatanismo. O bom médico é aquele que usa de todos os seus sentidos( olhos, ouvidos, tato, olfato) e das mãos para se chegar a um correto diagnóstico. Alguns exames fazem parte como complemento nessa boa relação .
 Numa concepção moderna temos hoje a chamada Medicina baseada em evidências. Significa que todo medicamento, método diagnóstico, procedimentos clínicos ou cirúrgicos só podem ser oferecidos às pessoas depois de rigorosos ensaios clínicos chancelados por comitês de ética médica e aprovados pelo Conselho Federal de Medicina.
Qualquer conduta médica fora desses critérios significa no mínimo prática duvidosa, eficácia não comprovada e atitude de risco para o paciente. Ou seja, um expediente de charlatão. Se não ilegal, porque no caso  de um profissional com título de doutor, é altamente desumana e sem princípios bioéticos.
Vale lembrar que dentro de nosso ordenamento jurídico charlatanismo é crime. Para o código penal o charlatão é um fraudador ou estelionatário, não importa qual atividade ilegal e antiética que ele exerça. Médico, odontólogo, psicólogo, terapeutas em geral, advogado, etc.
O caso mais recente de um profissional diplomado  cassado por charlatanismo ocorreu em maio de 2014 no Paraná. A ex  psicóloga Marisa Lobo. Ela propunha a chamada cura gay. Houve na época um projeto de lei(PL) do deputado João Campos PSDB-GO, no sentido de se tratar o homossexualismo. Tal PL muito polêmico e criticado na época acabou sendo engavetado e fora de pauta na câmara dos deputados. Uma proposta no mínimo inoportuna, infeliz e de mau gosto.  Outro caso rumoroso e emblemático de um charlatão diplomado foi do ex médico e pseudocirurgião plástico Marcelo Caron. Ele atuava em Goiânia-GO. Foram várias vítimas mutiladas, mortes e processos na Justiça.
 O charlatanismo no Brasil é uma prática muito frequente e recorrente. Basta relembrar algumas particularidades de nosso país. Temos uma legislação arcaica, leniente e tolerante com tal tipo de crime. O charlatão mais perigoso e de risco para a sociedade é aquele que tem diploma de doutor. As atividades com maior incidência dessa prática são as profissões de saúde. O charlatão diplomado se torna um agente muito nocivo em sua prática porque ele tem a proteção e disfarce da profissão que exerce de forma legal(embora antiética e negligente) com registro no conselho de sua classe profissional. Nesse cenário o médico tem sido um personagem de relevo.
 É oportuno lembrar que em nosso país qualquer médico pode exercer qualquer especialidade, sem titulo de especialista .  Não há lei ou portaria dos Conselhos de Medicina que vede o médico de exercer a especialidade que bem lhe aprouver. Pode parecer um fato esdrúxulo e disforme, mas este é o Brasil no qual vivemos. Uma outra cultura muito perversa que também caminha paralela com o charlatanismo é o alto consumo  de medicamentos e a  automedicação. Somos campeões em vendas de remédios .
As propagandas e os apelos às atividades charlatanescas e de curandeirismos estão em cada esquina. Tudo é muito ostensivo. Para tanto, basta abrir as revistas e jornais e lá estão os anúncios desses profissionais que prometem inúmeras terapias e cura para tudo; desde impotência sexual até do câncer . Nas rádios e televisões, tudo se dá, às escancaras. Nenhum conselho de categoria profissional (Medicina, Odontologia, Psicologia, Fisioterapia etc) ou vigilância sanitária  se preocupam em ao menos verificar o estado sanitário ou instalações desses serviços. Quando muito existe alguma fiscalização ou inquérito diante de  uma denúncia ou boletim de ocorrência de lesão corporal ou morte. Aí os conselhos da profissão abrem inquérito e fiscalizam. No mais tudo continua como dantes , nos  quartéis  de Abrantes .
Por tudo isto e tanto escracho tinham razão o general de Gaulle e Nelson Rodrigues. O primeiro cravou que o Brasil não é um país sério, já o segundo bem descreveu o nosso complexo de vira-latas. O charlatanismo nosso de cada dia é mais uma mostra de que esses dois personagens tinham razão em suas afirmações premonitórias. Além do vira-latas, cultivamos muitos outros complexos. O de um país sem solução, do jeitinho brasileiro desonesto de se levar vantagem em tudo, o da dengue, o da corrupção , o da aceitação de tudo de forma passiva. Até na área de drogas temos outros. O complexo vitamínico comprado livremente nas farmácias de cada esquina, o complexo de antidepressivos receitados pelos médicos e usados  a vida inteira, o complexo de inferioridade etc.  Que triste.     Maio/2015 



João Joaquim - médico - articulista DM - joaomedicina.ufg@gmail.com -www.jjoaquim.blogspot.com

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