quinta-feira, 30 de julho de 2015

ÉTICA x tragédia

A TRAGÉDIA E NOSSOS  SENTIMENTOS ÉTICOS
João Joaquim


 Nosso junho/2015 terminou com uma daquelas semanas de surtos. O que é um surto? É uma manifestação súbita de qualquer coisa, um surgimento repentino e brusco de um fato inusitado, algo  anormal; ou também de uma atitude ou comportamento que deveria ser uma constante ou característica de uma sociedade. O surto dessa última semana de junho foi de uma minitempestade de  ética. Comportamento ou  inclinação que deveria ser permanente na vida das pessoas.
Aliás, é oportuno repisar essa tendência de nosso Brasil. Mesmo quando o  Brasil era apenas pau-brasil  parece que já funcionava assim. Aí foi só Pedro Álvares Cabral e Pero Vaz de Caminha se aportarem por aqui que as coisas desandaram de vez. E bem o disse também o Jesuíta Padre Antonio Vieira( idos de 1600). O surto de ética, de decência, de solidariedade, de respeito à dor alheia, dessa última semana de junho/2015, veio com a morte de alguém e as imagens do cadáver destroçado veiculadas pelas redes anti-sociais ( que a sociedade chama de sociais). E aqui não importa a que classe pertença esse falecido, que atributos tenham esse personagem e sua família. Não deveria fazer diferença se ele é famoso e midiático ou importante. Ética e dor alheia, o luto, a luta de cada um devem merecer a mesma acolhida, a mesma consideração de todos nós e dos poderes constituídos; do Estado, das leis, da justiça e da imprensa.
Para bem situar a referência acima expressa, eu não conhecia o sertanejo Cristiano Araújo. Ele e sua namorada morreram em um grave acidente de carro (capotagem) em uma rodovia (Br 153) próxima a Goiânia(24.06.15). Funcionários de uma clínica  que prepararam os cadáveres postaram fotos na internet  dos corpos com graves mutilações decorrentes do sinistro. Como corolário pipocaram várias mensagens e matérias jornalísticas de protestos e condenação pela divulgação das fotos e vídeos. Nada mais correto, honesto e justo tais sentimentos de repulsa e de indignação contra a divulgação e repique de cenas tão fúnebres e dolorosas para amigos e familiares das vítimas. De imediato, ao ler tais notícias eu me neguei a ver tais cenas, condenei e as repudio de forma contundente. Eu nunca usei e tão cedo quero me aderir ao tal de whats-App.
Eu, por índole e formação , frente a morte de qualquer semelhante e irmão lembram-me as palavras do poeta e escritor britânico  John  Donne. “ A morte de qualquer pessoa me diminui porque estou envolto no contexto da humanidade. Portanto, não pergunte por quem os sinos tocam, eles dobram por você”.
O curioso e interessante é o quanto de outras lições podemos deduzir do fato aqui motivador desta digressão crítica. A primeira delas, dentro do princípio do surto das coisas. Nossa justiça, as autoridades, muitas vezes cumprem de forma célere e a contento o seu múnus público mediante rumoroso clamor popular ou incisivos pedidos de socorro. Isto deveria ser uma regra comezinha e rotineira de juízes com suas liminares, das polícias em instaurar inquérito; e não apenas nas tragédias de pessoas ricas, famosas e de grande visibilidade midiática.

 
O segundo aprendizado envolve uma lição e demonstração  de hipocrisia. Alguns canais de televisão que condenaram a divulgação das imagens da tragédia do casal morto são as mesmas mídias de TV que exibem os reality shows com enredos pornô-eróticos ou então os programas policiais diários com cenas e fotos de crimes os mais perversos  em tempo real. Nesses programas, exibidos à luz do dia, nas horas de lazer de nossas crianças, são mostradas matérias com o que há de mais vil, sórdido e chocante ao coração e sentimentos de bondade e de humanidade das pessoas. Seria o equivalente àquele conselho: façam o que eu louvo mas não o que eu exibo e faço. A estratégia aqui é ter audiência . E ela se dá pelos índices de nossa cultura, nossa educação.
Toda essa vilania e baixaria se dão em nome de uma tal de liberdade de imprensa e expressão. Na verdade temos aqui uma libertinagem de imprensa e comunicação tal o teor e natureza desse jornalismo de baixo calão , que aliás, tem um público seleto e cativo, os mesmos usuários das maledicentes e perniciosas mídias virtuais.
O Brasil que vive de tantos surtos e epidemias , deveria sofrer também de um surto de qualidade. Um outro surto que vez e outra acomete nossa sociedade é a consciência  da podridão , da fetidez, da hediondez que reina na Internet e suas mídias com seus múltiplos aplicativos de comunicação a exemplo das redes sociais . Para o afloramento  dessa consciência ética  é sempre necessária alguma tragédia , algum crime hediondo de pessoa pública e famosa etc.  Os tão propalados e massivos facebook  e  whats-App têm sido colocados a serviços de um cardápio infinito de futilidades, de baixaria, de mexerico, de fofocas e muitas outras inutilidades e delitos de pessoas parvas, cretinas, idiotas ,  insensatas, desocupadas e criminosas. 
 Está faltando muitos outros surtos construtivos  em nossa sociedade. Cada cidadão , cada classe de profissionais e de gente têm ,sim, uma Ética. Bandidos e criminosos têm a sua ética . Os regimes autoritários até, têm a sua ética. Cada um tem a sua visão do que é certo e errado para ele. A boa e verdadeira ética é aquela que vem do DNA da família de boa ética , ela é hereditária. Eu posso ser uma pessoa cidadã, que sabe viver em sociedade e inclinado ao bem e à virtude ou ao mal e aos vícios. Ética se aprende, sim, de berço. Boa ou má vai depender dos valores que são impingidos à criança desde a chupeta. Um vez adulto  mal educado e mal formado não há  código profissional , civil ou penal que dê jeito.  Que triste ciclo estamos vivendo . Junho/15.  

 João Joaquim de Oliveira  médico – articulista do DM joaomedicina.ufg@gmail.com     

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