MULETAS DO IDIOMA
DAS MULETAS E ESCORAS NA
LINGUAGEM
João
Joaquim
Eu já falei em outros textos sobre próteses
(substitutos de tecidos ou membros humanos) e órteses (aparelhos que previnem
ou corrigem deformidades). A muleta, a bengala, o andador podem ser
considerados órteses. Estes insumos são muito prescritos por
profissionais de saúde, ortopedistas e fisioterapeutas por exemplo. Mas, já
advirto que não cometerei o desatino ou impropérios de falar sobre matéria de
que ignoro. Sócrates nos aconselhava: “ ajuizado serás não supondo que sabes o
que ignoras”.
Entrementes, data máxima venia, do
mestre da filosofia grega eu vou me rebelar e falar de outros apoios e muletas
de que vale o ser humano. Refiro-me às muletas ou escoras da retórica,
que muitos chamam também de cacoetes de linguagem, aqueles expletivos tão
recorrentes na comunicação diária. E já tranquilizo a todos, não constitui
vício dos menos instruídos, dos menos ou pouco escolados.
No linguajar oral ou coloquial eu não vejo como
tanto inútil alguns cacoetes na comunicação. Isto se dá por exemplo pela
espontaneidade e improvisação das ideias no discurso. Algo muito diverso e
pedante quando se trata de um texto escrito, mesmo naqueles não formais. Na
retórica de um grande orador não é incomum se perceber alguns cacoetes
estilísticos. Recursos esses para encantar a plateia ou mesmo quando o autor o
faz com a intenção de elaborar o pensamento seguinte e manter a atenção
do auditório.
Como exemplo desse arranjo estilístico temos a
locução expletiva -é que- que embora signifique preencher ou completar o
sentido da frase não faz nenhuma falta se for eliminada do texto.
Veja este período: o PT (é que) é o culpado da crise que
vive o Brasil . Elimine o -é que- e o PT continuará culpado na mesma
intensidade.
Na comunicação formal (ofícios, memorandos, cartas)
encontramos muitas pérolas quando se fala em cacoetes de linguagem. Algumas
delas muito encontradiças: 1) por motivo de força maior. Não seria melhor o
missivista explicar que força maior é esta? Aqui cria-se um suspense
injustificável para o receptor da mensagem. 2) A quem interessar possa. Penso
que muitos já receberam uma carta de apresentação com esta expressão. Ela traz
um certo ar de desprezo ou arrogância, além de absolutamente inócua na
comunicação pretendida . 3) Venho por meio desta.....Introdução vazia e
sem sentido, encontradiça em muitos memorandos e ofícios.
Nas entrevistas de muitos personagens públicos ,
nos veículos de comunicação, nas transmissões esportivas; temos cacoetes
e expressões que incomodam os tímpanos. As mais ouvidas são: de forma que;
correr atrás do prejuízo, mais completo, a nível de, um pouco demais etc.
Imagine o sujeito correr atrás do prejuízo e encontrá-lo. Que decepção! Como bem disse H.L. Mencken , lugares-comuns ou
clichês têm origem no medo do desconhecido, no conforto medíocre de quem,
preferindo não arriscar, se basta com fórmulas prontas .
Não menos maçantes temos : em virtude de, não por
acaso, de repente, entende? Tá, né, a gente isso, a gente aquilo, tipo assim,
meio que ; e muitas outras tão vazias quanto inúteis.
E como arremate vale registrar como campeã das
muletas ou bengalas linguísticas a expressão empregada por recepcionistas ou
secretárias. Vou estar encaminhando sua ligação. Há poucos dias fui
vítima dessa cacofonia e emendei: a sra vai bem estar , ou mal estar
encaminhando o meu pedido. Ela não entendeu bem a minha réplica . Nem eu!
João Joaquim - médico - articulista DM