sexta-feira, 31 de agosto de 2018


A MEDICINA DO SACERDÓCIO E DAS TECNOLOGIAS DIGITAIS

João Joaquim  

Não impropriamente a medicina já foi correspondida e definida como um sacerdócio. E de fato na sua gênese, na sua origem foi assim que os seus percursos, os seus criadores a  idealizaram. Para tanto faz-se necessário ler ao menos os juramentos de duas figuras da história da medicina, Hipócrates, filósofo e médico; e de Moisés Maimônides (1135-1204), judeu e grande cientista das religiões como judaísmo, islamismo e mesmo do Cristianismo, ou seja, ele foi um pensador eclético e sem barreiras.
Assim pensaram esses dois luminares históricos nos albores da profissão e na idealização de como deveria se comportar, pensar, atuar e praticar essa medicina, a arte de prevenir, de aliviar o sofrimento e cura das doenças. Daí surgiram   várias referências ,  sendo o  médico comparado a um sacerdote. Seria aquele profissional  com um misto de fraternidade, de arte e ciência ; um sacerdote da saúde a distribuir os dons dessa sua formação aos desvalidos de saúde, aos que sofrem, que padecem de qualquer enfermidade e tem ameaçada a sua vida.
Ao trazer essas atemporais concepções para nossos tempos poderíamos considerar a prática da medicina, tendo a internet e a informática como divisórias de duas épocas bem estanques e bem distintas. Porque essas duas conquistas da humanidade marcam uma era de antes e uma era do pós tecnologia da comunicação e de armazenamento de informações, as hoje já populares tecnologias da informação (TI).
A Informática cuida de    arquivo de dados com o emprego de vários instrumentos de gravação e salvamento de dados (salvar, salvar como). Os avanços tecnológicos e científicos coincidentes com o nascimento da internet e informática superam aqueles de 50 anos para trás. Nunca na história houve tantos avanços como os conferidos neste meio século .
Trazendo todos esses avanços técnicos e das ciências para a área da saúde se conclui :  o quanto de aprimoramento e eficácia em diagnósticos na área de análises clinicas, em radioimunoensaio, em dosagens hormonais e exames de imagem. Com isso foi também possível a medicina se superespecializar. Hoje, têm-se os especialistas segmentados no corpo humano. Assim temos o ortopedista de joelhos, o de coluna, o de mãos, o de ombros. Atingimos uma tamanha fragmentação de especialidades, que dividiram os órgãos em especialistas. Os exemplos são as subespecialidades da cardiologia. Não bastar ser cardiologista, têm-se os especialistas de hipertensão arterial, de arritmias, de marca-passo, de coronárias, de válvulas. Além do cirurgião dessa e outra parte do coração.
No campo da cirurgia, o quanto de qualidade, menor tempo operatório e segurança para o paciente e para o cirurgião. Como exemplo as cirurgias por endoscopias, laparoscopia (abdome), broncoscopia, laringoscopia. São técnicas empregadas para fins diagnósticos (biopsia, por exemplo) e fins curativos. Muitas são as doenças hoje realizadas com as endoscopias. A grande vantagem é o curto período de internação. 
Para o sistema cardiovascular, dispõem-se por exemplo das técnicas de cateterismo. Ele é rotineiramente utilizado para diagnóstico e terapêutica. Qualquer órgão vital como rim, coração, pulmão ou cérebro pode ter diagnóstico, implante de prótese  (stent  por exemplo) e outros procedimentos terapêuticos e cirúrgicos com segurança. São exemplos os stents nas coronárias, os clips de aneurisma cerebral e cateter para  desobstrução de alguma artéria de outro segmento corporal ou órgão interno.
Outros progressos têm-se os utilizados como a radioatividade, tanto na cura para a maioria dos tipos de câncer, bem assim exames de imagem,  como as radiografias e tomografias. São  exames de imagem que mostram as mínimas lesões dos diversos tecidos e órgãos internos.
De igual importância, nesses avanços tecnológicos e científicos, têm-se as opções terapêuticas para as mais variadas enfermidades. Basta para ficar em dois exemplos, os casos de infecções pelo HIV e muitos tipos celulares de neoplasia (câncer). Na década 1990, ser contaminado pelo vírus HIV era quase uma sentença de morte lenta, humilhante e dolorosa. Houve muitos avanços nas chamadas drogas antirretrovirais (HIV = retrovírus).
Ainda não se tem a cura plena da AIDS( infecção pelo HIV), mas um controle pleno da infecção viral e longa sobrevida. O mesmo sucesso terapêutico se tem para a grande maioria de tumores malignos, quando se tem a cura total ou vigilância para prevenção de recidivas.
Postas assim tais conquistas e avanços nas ciências da saúde, ficam e sobram aqueles princípios e postulados, equiparando a medicina a um sacerdócio em prol da saúde e do bem-estar humano. E o protagonista, elemento central e foco único ou primeiro da medicina, o homem, o paciente, quem padece de alguma doença ?
O que se tem hoje é uma nova relação médico/paciente. Diante de tantas opções diagnósticas e terapêuticas. Cada vez mais esse contato do profissional com o doente tem se tornado superficial, raso, rápido e robotizado. Cada vez mais o médico pouco escuta, pouco ausculta, pouco examina e está sempre apressado, porque tem múltiplos compromissos profissionais, múltiplos empregos, plantões, etc. Nesse contexto, o que tem predominado é uma medicina informatizada, laboratorial, digital e imagética. É quando entra em cena um sem-número de exames hematológicos, de anticorpos, de proteínas, vitaminas e minerais. No capítulo das imagens há o uso e abuso dos scans , das cintilografias, das tomografias, dos ultrassons, dos exames de doppler, das ressonâncias, scopias e cateteres.
O lado negativo e danoso às pessoas é que os charlatões nunca fizeram tanto sucesso. Existe muito enganoterapia no mercado. Nunca os charlatões diplomados fizeram tanto sucesso. Eles estão `a solta, consultam e curam até pela Internet. Um perigo que ronda a sociedade.
Em que pese todos os benefícios, com tanto aprimoramento das tecnologia e das ciências, o paciente tem sido desumanizado. Não se trata mais o doente (pessoa) ,mas, sim a doença. Não se trata mais pessoa, mas um órgão. Um fígado, um cérebro, um coração. A relação médico/paciente se tornou robótica, digitalizada e protocolar. Em lugar de pessoa, tem-se um caso clinico, o usuário, um prontuário, um caso clínico  comum , um caso interessante, um  laudo, senhas, escores, algoritmos, diagnósticos e prognósticos, são tendências na desumanização dos humanos; e pelo  visto a coisa vai piorar , no que há que se lamentar.
 As vedetes da Medicina passaram a ser o Laboratório, as imagens, o escaneamento do corpo humano, as plásticas, as remodelações, os tratamentos cosméticos , os botox, as lipos, as esculturas, os compostos químicos para tudo, até a tentativa dos elixires de longa vida. Onde tudo isso vai parar ? Ninguém sabe.  Agosto 2018

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