De Estimação ?
A ESCRAVIDÃO E TORTURA DOS ANIMAIS
João Joaquim
Nós humanos, mais humanos poderíamos nos tornar se nos relacionássemos
mais humanamente com os outros animais não humanos. O mundo seria mais belo, o
mundo seria mais aprazível, o mundo seria menos violento, e todos, homens e
animais poderíamos viver na absoluta harmonia. Ops, minhas escusas pelas
anáforas.
Ao certo o que se tem é que a relação do homem com os animais vem de
primitivas épocas. Tal interação de proximidade, exploração e cativeiro se
inicia na narrativa bíblia da construção de tamanha nau, a arca de Noé .
Isto sem dispensar o emprego da força animal. Impossível . Em feito
tão árduo e dispendioso necessário se fez o uso de ajuda de tração de
elefantes. Portanto, o seu recolhimento à arca não se deu de forma graciosa. E
mesmo quando da soltura da pomba para que ela retornasse com algum vegetal em
sinal de terra à vista. Era o recuo das águas do dilúvio. Conforme nos registra
o Livro de Genesis .
Fora da concepção e tradição bíblica o trato do homem para com os
animais foi sempre de muita exploração, violência e maus tratos, antes do
que de amparo, proteção e cuidado. E tal relação de desrespeito e ofensas não
se atenuou, mesmo após a era industrial e têm-se as explicações.
Muito da atividade motriz se fazia às custas de animais. Peguem-se os
exemplos dos equídeos. Quantos cavalos e muares não foram empregados em
operações de guerra até fins do século XIX e início do 20. Mesmo nos tempos
digitais, com a evolução do automóvel, e até das naves espaciais. Muitas
nações, muitas plagas desse planeta, ainda se movimentam com muito
emprego da força animal. Em muitas regiões inóspitas da terra cavalos e
barros (asnos) são os principais meios de transporte humano e de cargas.
A predação de animais é outro triste capítulo que envolve os humanos
versus animais. Se somos racionais deveríamos usar desse atributo superior para
proteger nossos irmãos não racionais. Sejam eles bípedes, quadrúpedes ou
mesmo ápodes por um design de criação. É o caso por exemplo dos anelídeos, dos
hirudíneos, dos peixes e ofídios. E mesmo grandes mamíferos. Basta rever a
biografia dos elefantes, dos rinocerontes e muitos irmãos primatas. Muitos já
foram extintos e outros em vias de sê-lo.
Para ser bem realista, até nossa mãe Luzia, de que tinha apenas um
esqueleto fóssil no museu nacional do Rio de Janeiro. A Luzia, que viveu em
Lagoa Santa MG, tinha quase 12 mil anos de idade. No incêndio do museu se
transformou em pó, ou melhor em cinzas. Não é que ela estava destinada a
tornar-se ao pó. Mas, pelo descaso de autoridades brasileiras, virou cinzas.
Cumpriram-se as escrituras sacras, veio do pó e ao pó tornou-se. Graças à
digitalização, ficaram ao menos sua silhueta virtual e algum busto de gesso.
O abate de animais como fonte de proteína na alimentação das pessoas
revela-se em outro condenável cenário adotado pela sociedade humana. Não que o
consumo de carne vermelha mereça repúdio. O que se critica é a forma de
criação, de transporte e abate dos bichos. Tudo se inicia pela forma, e pelas
condições onde se dão o crescimento e engorda desses animais. Muitas das
espécies para tais fins são confinadas em curtos espaços, em condições
degradantes, com extremo desconforto e indução de ganho de peso com substâncias
anabolizantes. O uso desses hormônios se traduz em um dano aos animais e às
pessoas que vão se alimentar desses produtos frigoríficos contaminados. Outros
derivados químicos na indústria frigorifica são as nitrosaminas, tidas e
provadas como cancerígenas.
Os maus tratos e condições degradantes na criação de animais para abate
têm outros requintes de crueldade. A exótica carne de vitela é obtida com a
criação de bezerros em diminutos confinamentos. São tratados com dieta para que
a carne fique branca ou rosada e abatidos com 3 a 4 meses. O animal não tem
nenhuma mobilidade e não tem direito sequer a tomar sol. Esta e outras formas
de violência são práticas comuns com outros animais como porcos e aves
para produção de carnes especiais.
Na produção do “foie gras” (fígado gorduroso ou esteatótico) os patos ou
gansos são tratados com uma sonda passada pelo esôfago da ave. O animal fica em
uma gaiola e recebe uma dieta líquida contínua num sistema chamado gavage.
Desta forma a engorda do animal e o fígado gorduroso se dão em poucos dias.
Trata-se de um processo patológico, a indução de uma doença, corresponde à
esteatose, encontradiça nos humanos; sobretudo em obesidade avançada, diabetes
e excessos alimentares e alcoólicos. Só mesmo os humanos são
capazes de tais esquisitices. Provocar uma doença no animal e dela se refestelar
de prazer e satisfação gastronômica (sic).
As técnicas de abate dos animais são outras demonstrações da
banalização da violência e tortura por que passam os animais.
Muitos dos maus tratos, violência e crimes contra os animais se fazem
sob a displicência, sob a tolerância, quando não com a chancela e omissão de
governos e autoridades sanitárias e do meio ambiente. Um exemplo para além do
absurdo se deu com um navio de carga viva em outubro 2015, em Barcarena PA, no
Rio Pará. Como apurado, a embarcação em precárias condições transportaria 5000
bois para a Ásia. O navio naufragou antes da partida. As carcaças dos 5000
animais continuam no fundo do Rio Pará. Nesse trágico dano à vida animal e ao
meio ambiente nada mais se falou, os responsáveis pela tragédia continuam
impunes. Trata-se da mais robusta e morta prova do quanto tem sido a
indignidade, vilania, desprezo e negligência dos mercadores e autoridades nas
relações com os animais.
A insensatez e brutalidade em questão de relações dos humanos com os
animais vão a um absurdo de escravizarmos muitos bichos, encarcerá-los,
prendê-los em peias e coleiras e referirmos a eles como nossos animais de
estimação . Imaginemos agora o inverso, se fôssemos adotados pelos bichos (
vide A Revolução dos Bichos , de George Orwell). Já pensaram nisso ? Se
vivêssemos guiados por coleiras e presos em gaiolas , em
estreitos e confinados apartamentos . Tudo feito pelos bichos,
nossos animais de estimação, que nos querem tanto bem ! Já Imaginou !
Outubro/2018.