terça-feira, 2 de abril de 2024

PAIS IDOSOS E FILHOS NEGLIGENTES

 A família, alicerce da organização social, desde os tempos mais remotos até os dias atuais vem evoluindo paulatinamente e ocasionando diversas mudanças em nossa sociedade e no ordenamento jurídico brasileiro. Por essa razão, a Constituição Federal da República assegurou à família especial proteção do Estado. A propósito, a entidade familiar é o primeiro grupo social a que um indivíduo pertence, e neste grupo é que se estabelecem valores e princípios iniciais, daí a necessidade de uma maior cautela estatal a este instituto. Contudo, analisando o texto da Constituição Federal, é notória a omissão do legislador ao conceituar família de forma tão concisa e, até mesmo, insuficiente. O instituto família comporta vários conceitos jurídicos, sociológicos e sempre dinâmicos na medida em que a sociedade evolui, por isso a dificuldade em conceituá-lo. Diante da omissão legislativa em discipliná-la, grandes doutrinadores têm tomado para si tal tarefa. Nesse sentido, Gonçalves ; entende que família em lato sensu, é aquela que “abrange todas as pessoas ligadas por vínculo de sangue e que procedem, portanto, de um tronco ancestral comum, bem como as unidas pela afinidade e pela adoção. Compreende os cônjuges e companheiros, os parentes e os afins”. Ainda, na lição de Pereira. 

Cuida-se o presente artigo da análise acerca do Abandono Afetivo Inverso e a violação do dever de cuidado por parte dos filhos, situação cada vez mais recorrente pelo mundo, que tem gerado a vitimização dos idosos tanto no âmbito físico, quanto emocional. Não obstante o afeto seja a mola propulsora das relações familiares, certo é  que o idoso ainda tem sido vítima de abandono afetivo pela própria prole. 

Pretende-se, por meio do procedimento indutivo, investigativo bibliográfico e uma abordagem discursiva, chamar a atenção não somente dos filhos que se utilizam desta prática nefasta, mas de toda a família sobre a importância do dever de cuidado, como fonte de melhor qualidade de vida do idoso. Tem- se por motivação minimizar o sofrimento do idoso não pelo intermédio da prestação pecuniária, mas pela conscientização dos próprios filhos, pois, embora amar não seja obrigatório, cuidar é um dever constitucional que não pode ser descurado.

O fenômeno está presente em muitas famílias. Entretanto, nessa prole, sempre haverá um desbalanço nesse cuidado, nessa dedicação. Porque sempre existiram e existem os filhos omissos e negligentes nesse cuidado filial. Os chamados deslizantes, os que fogem às suas obrigações do cuidado.  

PAIS INVÁLIDOS REQUER CUIDADOS ESPECIAIS DOS FILHOS.  SABE AQUELE PAI OU MÃE, que idosos se tornam, e vários filhos que não cuidam como deveriam fazer?

Os participantes definem um idoso dependente como alguém a "necessitar de apoio" (apoio diversificado:  físico, social, espiritual, ...), pois são pessoas cujo processo de envelhecimento se desenrolou de forma mais acelerada (pela patologia). Os participantes referem que muitas vezes os idosos dependentes no domicílio são "abandonados" em diversas áreas: familiar (algumas famílias não querem cuidar, outras são negligentes e algumas não podem por falta de competências ou tempo); social (os mais carenciados podem não obter o apoio social formal necessário, por exemplo há falta de vagas em apoio domiciliar); saúde (por exemplo, alguma falta de articulação entre profissionais, que pode traduzir-se na polimedicação).

Os enfermeiros referem que as pessoas idosas dependentes vivem "no quarto" (quase sempre estão acamadas) e lá transcorre a sua vida (comer, dormir, cuidados técnicos, ...); relataram o caso de uma senhora que há sete anos não sai do quarto, pois a sua cuidadora também é idosa e doente.

Agora, imagine um idoso que precisa de cuidados de higiene, alimentar, cortar unhas e cabelo, trocar de roupa e fraldas, banhos de sol- vários filhos que cuidam são jovens, fortes, robustos, saudáveis, tem todo tempo de cuidar; no entanto, alguns ou uns vão se escafedendo, se desculpando, por uma justificativa esfarrapada de não levar jeito para esse zelo básico; resultado: ou o idoso vai morrer mais depressa, ou algum filho isolado assume as tarefas; melancólico, mas existem os tais. A lógica nessa explicação, sem explicação, é simples e objetiva: aprende-se com quem faz a tarefa na maior parte das vezes. Fulano (a) você me ensina como eu posso ajudar?

 A solidão acaba por marcar a vivência da dependência na pessoa idosa e nos cuidadores familiares (principalmente nos idosos). Estas pessoas idosas dependem sempre de alguém (ser cuidado por ...) ou de diversas pessoas: familiares, amigos, vizinhos, cuidadores formais e/ou voluntários. O idoso dependente vivencia alterações na sua autoimagem, que os participantes simbolizam pelo "espelho: a magreza é frequente, em consequência da dependência e escassa mobilidade; o uso de ajudas técnicas exige adaptação e marca a incapacidade; as amputações exigem ajuda para a adaptação (reaprender e reabilitar) com forte impacto na imagem. ’

Outros cenários encontradiços no meio brasileiro, aquele idoso que enquanto tinha forças e vitalidade, tudo ia bem porque se comprazia com a parentela e “amigos de copo e garfo” à farta e em profusão, em cada refeição e regalos. Adoeceu, envelheceu? Perdeu! Perdido fica porque os amigos, os parentes e comensais sumiram. Simples explicar. “Amigos”.

Ao que esclarecem estudos oriundos de Japão e Coreia do Sul (cultura oriental) a América latina é repleta de uma cultura que não preza muito o indivíduo idoso. Subsiste no recôndito e interno dessas pessoas, um sentimento de prestar pouca valia ou serventia a um idoso pai, avô, tia e tio. Vem de encontro ao que preceitua a cultura, a ética e as relações familiares na cultura oriental.

Há uma menos valia do idoso, no seio familiar dessa cultura latina. São inúmeros os filhos e filhas que deixam seus idosos, desvalidos, inválidos pais à própria sorte, ao arrepio dos cuidados mais elementares, alimentação, vestuário, cuidados de higiene, de uma lavagem de cabeça e cabelos, fazimento de barba, o cuidado e compromisso de levar um idoso ao médico assistente, a um hospital, ao acompanhamento desse idoso institucionalizado, internado. Alguns filhos ainda os levam para algum abrigo, casa de albergue, casa de apoio social, clínica de cuidados básicos.

Surpreende-nos muito o comportamento, o caradurismo de muitos filhos e filhas que não se coram, que não se vexam, que não se sensibilizam, que não se solidarizam, que não compartilham com algum outro parente, filho ou filha nos cuidados, despesas, orçamento, nos custos diários desse pai ou mãe idosos, fragilizados, e agora carentes desses filhos. Alguns filhos robustos, parrudos, corados, saúde de ferro; muitos que auferem bons salários em seus empregos ou negócios. Todavia, não se coram, não se vexam em deixar para outras pessoas,  para outro parente cuidador, esses deveres e trabalho de assistência  a esse idoso. E não raro, ainda caem na esparrela e desculpas esfarrapadas de estar meio doente, uma gripezinha, um achaque, um mal-estar, uma viagem para.. uma reunião.....

Agora para dividir bons pratos, bons acepipes, manjares, farras, pizzas, churrascos, rodízios de pizzas, carnes, mandioca, galinha, vaca atolada, tudo bem! Aqui, sim, nenhum impedimento. Oh gente! Como se diz aqui em terras nordestinas, bem destinadas, nesses quesitos, de responsabilidade, de empatia, de compromisso com os pais idosos e agora desvalidos, frágeis. Oh gente!

 

 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade Da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. 9. ed.
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